Estamos às vésperas
de comemorar os 26 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), legislação
conquistada através de mobilização social e política trilhada no Brasil, desde
a década de 1970, que buscava romper com a forma humilhante, vexatória e
coisificada com a qual a infância e a adolescência eram tratadas.
Com a CF de 1988, no contexto
ideopolítico, socioeconômico e cultural, o Brasil se abre para a democracia através
da promulgação da Constituição Federal que traz em seu bojo vários avanços e demarca uma ruptura com a situação irregular e constrói um novo olhar para a
infância e adolescência, tendo em vista o reconhecimento destes como seres em
condição de desenvolvimento, pessoas com prioridade absoluta nas políticas sociais,
sem distinção de etnia, condição socioeconômica e religiosa, orientação sexual
e classe social e aponta como responsáveis pelo cuidado e proteção, com a
infância e a adolescência, a família, o Estado, a sociedade em geral e a
comunidade.
Do ponto de vista legal o Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA) promove uma “ruptura” à proposta do Código de
Menores de 1979, que entendia as crianças e adolescentes como “objeto” da
intervenção judicial, Código este que tinha sua função primeira o controle das
crianças e dos adolescentes pobres que apresentassem, segundo a lógica do
Estado e da sociedade, uma conduta que deveria ser “ajustada”, coibida.
O ECA reconhece valor da criança e
do adolescente como ser humano, não “pré-humano”, como se fosse possível tal
condição, nem tal pouco “pós-humano”, neste sentido, não estabelecendo qualquer
hierarquia entre crianças, adolescentes e adultos e sim reconhecendo sua situação
peculiar de desenvolvimento a qual reclama da família, do estado e da sociedade
cuidado e proteção.
Nestes quase 26 anos foram muitas
conquistas:
·
Os conselhos dos
direitos da criança e do adolescente, com atribuição de formular, deliberar e
avaliar às políticas sociais para a infância e adolescência;
·
Os fundos da
criança e do adolescente, com gestão dos Conselhos;
·
Os conselhos
tutelares, criados para zelar pela efetivação dos direitos;
·
As conferências
dos direitos da criança e do adolescente realizadas, a cada dois anos para
conferir, avaliar e propor ações de implementação do ECA.
Destas conquistas, sem duvida, vale
destacar a criação dos Conselhos Tutelares em todos os municípios brasileiros, responsáveis
por zelar pela efetivação dos direitos conquistados no ECA, talvez a conquista que
mais tenha se materializado e se efetivado.
No âmbito das formulações legais
foram criadas às orientações, planos e sistemas, tais como:
·
Sistema de Informação
para a Infância e Adolescência (SIPIA);
·
Plano de Erradicação
do Trabalho Infantil;
·
Plano de
Enfrentamento a Exploração e Violência Sexual;
·
Diretrizes para
as medidas socioeducativas de internação;
·
Programa de Proteção
a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM);
·
Plano Nacional de
Promoção, Proteção e Defesa dos Direitos de Crianças a Adolescentes à
Convivência Familiar e Comunitária;
·
Sistema Nacional
de Atendimento Socioeducativo (Sinase).
São apenas alguns exemplos dos
muitos avanços que tivemos nesse processo de implementação.
Do ponto de vista cultural os
avanços ainda são tímidos, mas já perceptíveis, considerando que a mudança de
atitudes exige uma profunda revisão de valores, compreendendo que mudanças societárias
serão sempre, ou quase sempre, um processo lento, e que trará a síntese de diferentes
correntes de pensamento e forças diferentes que compõem a sociedade brasileira.
No ano de 2007, foi criada a Lei nº
11525/2007, que institui a obrigatoriedade do conteúdo que trata dos direitos
das crianças e dos adolescentes no currículo de ensino fundamental para que as
escolas possam repensar seus planos de trabalhos anuais e planos de aulas, com
base nos direitos humanos de criança e adolescente.
Não se trata apenas de trocar os
óculos, mas mudar a forma e o conteúdo do olhar.
Olhar a criança e o adolescente como
sujeitos humanos nem maiores, nem menores, mas apenas iguais enquanto sujeitos
de direito.
Texto inspirado no texto de Francisca Pini no livro SALVAR O ECA.